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terça-feira, 2 de agosto de 2022

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ESTAGIÁRIA. ENQUADRAMENTO NO CONCEITO DE AGENTE PÚBLICO PRECONIZADO PELA LEI 8.429/92

RECURSO ESPECIAL Nº 1.352.035 - RS (2012/0231826-8) RELATOR : MINISTRO HERMAN BENJAMIN RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL RECORRIDO: xxxxxxxxxxxxxx ADVOGADO : xxxxxxx 

EMENTA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ESTAGIÁRIA. ENQUADRAMENTO NO CONCEITO DE AGENTE PÚBLICO PRECONIZADO PELA LEI 8.429/92. PRECEDENTES. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 

1. Cuida-se, na origem, de Ação de Improbidade Administrativa proposta pelo Ministério Público Federal, ora recorrente, contra Michele Pires Xavier, ora recorrida, objetivando a condenação por ato ímprobo, praticado quando a recorrida era estagiária da CEF, consistente na apropriação de valores que transferiu da conta de um cliente, utilizando, para tanto, senha pessoal de uma funcionária da CEF, auferindo um total de R$ 11.121,27 (onze mil, cento e vinte e um reais e vinte e sete centavos). 

2. O Juiz de 1º Grau julgou o pedido procedente. 

3. O Tribunal a quo negou provimento aos Embargos Infringentes do ora recorrente, e assim consignou na decisão: "Por isso mesmo, não se pode considerar probo o contexto em que um estagiário possui poder semelhante ao de um agente público, reclamando cautela a imposição das reprimendas cominadas à improbidade administrativas a eventual excesso do estagiário." (fl. 476). 

4. Contudo, o conceito de agente público, constante dos artigos 2º e 3º da Lei 8.429/1992, abrange não apenas os servidores públicos, mas todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função na Administração Pública. 

5. Assim, o estagiário que atua no serviço público, ainda que transitoriamente, remunerado ou não, se enquadra no conceito legal de agente público preconizado pela Lei 8.429/1992. Nesse sentido: Resp 495.933-RS, Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 19/4/2004, MC 21.122/CE, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. p/ Acórdão Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 13/3/2014. 

6. Ademais, as disposições da Lei 8.429/1992 são aplicáveis também àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma, direta ou indireta, pois o objetivo da Lei de Improbidade é não apenas punir, mas também afastar do serviço público os que praticam atos incompatíveis com o exercício da função pública. 

7. Recurso Especial provido. ACÓRDÃO

quarta-feira, 15 de janeiro de 2020

Temas para Seminário - ADMINISTRATIVO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INSTAURAÇÃO DE INQUÉRITO CIVIL E POSTERIOR AJUIZAMENTO DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO.


EXERCÍCIO DE DIREITO

Delegado da PF no Paraná não será indenizado por rejeição de ação de improbidade


A teoria da responsabilidade objetiva do estado não se aplica aos atos judiciais, nem à atuação do Ministério Público. Assim, ainda que uma denúncia seja rejeitada ou julgada improcedente, não cabe responsabilizar a União, a não ser que se comprove abuso de poder ou conduta temerária e/ou dolosa do agente ministerial.Por este fundamento, a 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região negou apelação de um delegado da Polícia Federal que teve indeferido pedido indenização por danos morais por ter respondido ‘‘indevidamente’’, segundo a inicial, a uma ação civil pública por improbidade administrativa.

A ACP foi sumariamente rejeitada pela 4ª Vara Federal de Curitiba, sem que tenha havido, ao menos, recurso do Ministério Público Federal do Paraná.

A relatora da apelação no TRF-4, desembargadora Vivian Josete Pantaleão Caminha, ressaltou que a extinção da ação de improbidade se deu pelo não enquadramento do fato imputado ao conceito legal de ato ímprobo, que pressupõe conduta imoral, potencializada pela má-fé e desonestidade.

Ou seja, a julgadora daquele processo entendeu que não ficou demonstrado, desde logo, que o réu tenha agido com dolo genérico. Acaso houvesse alguma incorreção de conduta, observou, esta seria classificada como culposa — por negligência/imperícia na condução do trabalho policial —, o que descaracteriza o ato tido como ímprobo, à luz do artigo 11 da Lei 8.429/92.

‘‘Destarte, não houve o reconhecimento de que a iniciativa do órgão ministerial de processar o réu, por improbidade administrativa, fora temerária ou abusiva, mas, sim, que, na percepção do juiz da causa, os fatos — tal como descritos na petição inicial — não permitiam inferir um agir malicioso ou desonesto do réu, o que era exigível, tendo em vista a tipificação legal apontada (que só comporta a modalidade dolosa)’’, escreveu Vivian no acórdão, fulminando a pretensão indenizatória do autor.

‘‘Operação titanic’’
Segundo os autos, tudo começou em 2009, no âmbito da ‘‘operação titanic’’, que investigava o tráfico de cocaína no porto de Paranaguá (PR). O autor, investido da condição de delegado da PF, solicitou autorização, ao juiz da Vara de Inquéritos Policiais da Comarca de Curitiba, para monitoramento telefônico, ação controlada e quebra dos sigilos telefônicos e fiscais de possíveis traficantes.

Em 2014, ele foi pego de surpresa com uma notificação do MPF para responder ação de improbidade administrativa. A acusação: ter solicitado diligências e produção de provas ao juízo estadual mesmo sabendo que seriam de competência da Justiça Federal, já que a investigação envolvia tráfico internacional de drogas.

Em síntese, ele teria induzido em erro os agentes da Justiça Comum paranaense, que não têm competência jurisdicional para cuidar deste tipo de caso.

Na inicial indenizatória, o autor disse que chegou a contatar o juiz e a promotora de justiça daquele processo, a fim de obter deles uma declaração por escrito de que não foram enganados por ele. 

Destacou que esta situação lhe trouxe enorme constrangimento e abalo, já que trabalha com estas autoridades da justiça estadual há muitos anos. Por fim, afirmou que a existência da ACP influiu direta e negativamente na sua carreira, pois, além de jamais ter respondido a qualquer tipo de processo, sempre foi alvo de reconhecimento e de homenagens.

Sentença de improcedência
O juiz Augusto César Pansini Gonçalves, da 6ª Vara Federal de Curitiba, julgou improcedente a ação reparatória de danos morais. A seu ver, o fato de uma ação de improbidade ser julgada improcedente não dá ao réu o direito à indenização por danos morais, exceto se comprovado que o autor da demanda judicial agiu com dolo, com imprudência grave ou leviandade inescusável.

Nesse mesmo sentido, citou o REsp 592811, 2003.01649970/PB, julgado pela 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que decidiu que a ação penal instaurada pelo Ministério Público nada mais é do que ‘‘legítimo exercício de direito’’, ainda que a pessoa denunciada venha a ser inocentada.

‘‘Desse modo, para que se viabilize pedido de reparação, é necessário que o dano moral seja comprovado, mediante demonstração cabal de que a instauração do procedimento se deu de forma injusta, despropositada e de má-fé’’, expressou o ministro o ministro-relator Castro Filho no acórdão daquele julgado.

Por outro lado, segundo Pansini, o fato de a ação de improbidade ter sido rejeitada em caráter liminar não prova que o MPF agiu de forma temerária, como sugere a peça inicial. Além do mais, a juíza Soraia Tullio, da 4ª Vara Federal de Curitiba, não mencionou a ‘‘suposta temeridade’’ na atuação do parquet federal. O que a magistrada deixou claro na sentença que rejeitou a denúncia – frisou o juiz Pansini  –  é que o autor não cometeu um ato de improbidade, e não que o MPF agiu de forma precipitada.

‘‘De igual modo, o fato de MPF não ter recorrido da sentença que rejeitou a demanda de improbidade, renunciando, inclusive, ao prazo recursal, não prova que ele agiu de forma temerária ao propor aquela ação’’, concluiu o julgador.

Clique aqui para ler a sentença

Clique aqui para ler o acórdão

5002570-12.2016.4.04.7000/PR
Jomar Martins é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio Grande do Sul.
Revista Consultor Jurídico, 14 de janeiro de 2020, 21h43


domingo, 27 de outubro de 2019

CARACTERIZAÇÃO DE TORTURA COMO ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.


 
A tortura de preso custodiado em delegacia praticada por policial constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da  administração pública.

O legislador estabeleceu premissa que deve orientar o agente público em toda a sua atividade, a saber: “Art. 4° Os agentes públicos de qualquer nível ou hierarquia são obrigados a velar pela estrita observância dos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade no trato dos assuntos que lhe são afetos”.

Em reforço, o art. 11, I, da mesma lei, reitera que configura improbidade a violação a quaisquer princípios da administração, bem como a deslealdade às instituições, notadamente a prática de ato visando a fim proibido em lei ou regulamento. Tais disposições evidenciam que o legislador teve preocupação redobrada em estabelecer que a grave desobediência – por parte de agentes públicos – ao sistema normativo em vigor pode significar ato de improbidade.

Com base nessas premissas, a Segunda Turma já teve oportunidade de decidir que “A Lei 8.429/1992 objetiva coibir, punir e afastar da atividade pública todos os agentes que demonstraram pouco apreço pelo princípio da juridicidade, denotando uma degeneração de caráter incompatível com a natureza da atividade desenvolvida” (REsp 1.297.021-PR, DJe 20/11/2013). É certo que o STJ, em alguns momentos, mitiga a rigidez da interpretação literal dos dispositivos acima, porque “não se pode confundir improbidade com simples ilegalidade. A improbidade é ilegalidade tipificada e qualificada pelo elemento subjetivo da conduta do agente. Por isso mesmo, a jurisprudência do STJ considera indispensável, para a caracterização de improbidade, que a conduta do agente seja dolosa, para a tipificação das condutas descritas nos artigos 9º e 11 da Lei 8.429/92, ou pelo menos eivada de culpa grave, nas do artigo 10″ (AIA 30-AM, Corte Especial, DJe 28/9/2011). A referida mitigação, entretanto, ocorre apenas naqueles casos sem gravidade, sem densidade jurídica relevante e sem demonstração do elemento subjetivo. De qualquer maneira, a detida análise da Lei n. 8.429/1992 demonstra que o legislador, ao dispor sobre o assunto, não determinou expressamente quais seriam as vítimas mediatas ou imediatas da atividade desonesta para fins de configuração do ato como ímprobo. Impôs, sim, que o agente público respeite o sistema jurídico em vigor e o bem comum, que é o fim último da Administração Pública. Essa ausência de menção explícita certamente decorre da compreensão de que o ato ímprobo é, muitas vezes, um fenômeno pluriofensivo, ou seja, ele pode atingir bens jurídicos diversos. Ocorre que o ato que apenas atingir bem privado e individual jamais terá a qualificação de ímprobo, nos termos do ordenamento em vigor. O mesmo não ocorre, entretanto, com o ato que atingir bem/interesse privado e público ao mesmo tempo. Aqui, sim, haverá potencial ocorrência de ato de improbidade. Por isso, o primordial é verificar se, dentre todos os bens atingidos pela postura do agente, existe algum que seja vinculado ao interesse e ao bem público. Se assim for, como consequência imediata, a Administração Pública será vulnerada de forma concomitante. No caso em análise, trata-se de discussão sobre séria arbitrariedade praticada por policial, que, em tese, pode ter significado gravíssimo atentado contra direitos humanos. Com efeito, o respeito aos direitos fundamentais, para além de mera acepção individual, é fundamento da nossa República, conforme o art. 1º, III, da CF, e é objeto de preocupação permanente da Administração Pública, de maneira geral. De tão importante, a prevalência dos direitos humanos, na forma em que disposta no inciso II do art. 4º da CF, é vetor de regência da República Federativa do Brasil nas suas relações internacionais. Não por outra razão, inúmeros são os tratados e convenções assinados pelo nosso Estado a respeito do tema. Dentre vários, lembra-se a Convenção Americana de Direito Humanos (promulgada pelo Decreto n. 678/1992), que já no seu art. 1º, dispõe explicitamente que os Estados signatários são obrigados a respeitar as liberdades públicas. E, de forma mais eloquente, os arts. 5º e 7º da referida convenção reforçam as suas disposições introdutórias ao prever, respectivamente, o “Direito à integridade pessoal” e o “Direito à liberdade pessoal”. A essas previsões, é oportuno ressaltar que o art. 144 da CF é taxativo sobre as atribuições gerais das forças de segurança na missão de proteger os direitos e garantias acima citados. Além do mais, é injustificável pretender que os atos mais gravosos à dignidade da pessoa humana e aos direitos humanos, entre os quais a tortura, praticados por servidores públicos, mormente policiais armados, sejam punidos apenas no âmbito disciplinar, civil e penal, afastando-se a aplicação da Lei da Improbidade Administrativa. Essas práticas ofendem diretamente a Administração Pública, porque o Estado brasileiro tem a obrigação de garantir a integridade física, psíquica e moral de todos, sob pena de inúmeros reflexos jurídicos, inclusive na ordem internacional. Pondere-se que o agente público incumbido da missão de garantir o respeito à ordem pública, como é o caso do policial, ao descumprir com suas obrigações legais e constitucionais de forma frontal, mais que atentar apenas contra um indivíduo, atinge toda a coletividade e a própria corporação a que pertence de forma imediata. Ademais, pertinente reforçar que o legislador, ao prever que constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de lealdade às instituições, findou por tornar de interesse público, e da própria Administração em si, a proteção da imagem e das atribuições dos entes/entidades públicas. Disso resulta que qualquer atividade atentatória a esse bem por parte de agentes públicos tem a potencialidade de ser considerada como improbidade administrativa. Afora isso, a tortura perpetrada por policiais contra presos mantidos sob a sua custódia tem outro reflexo jurídico imediato. Ao agir de tal forma, o agente público cria, de maneira praticamente automática, obrigação ao Estado, que é o dever de indenizar, nos termos do art. 37, § 6º, da CF. Na hipótese em análise, o ato ímprobo caracteriza-se quando se constata que a vítima foi torturada em instalação pública, ou melhor, em delegacia de polícia. Por fim, violência policial arbitrária não é ato apenas contra o particular-vítima, mas sim contra a própria Administração Pública, ferindo suas bases de legitimidade e respeitabilidade. Tanto é assim que essas condutas são tipificadas, entre outros estatutos, no art. 322 do CP, que integra o Capítulo I (“Dos Crimes Praticados por Funcionário Público contra a Administração Pública”), que por sua vez está inserido no Título XI (“Dos Crimes contra a Administração Pública”), e também nos arts. 3º e 4º da Lei n. 4.898/1965, que trata do abuso de autoridade. Em síntese, atentado à vida e à liberdade individual de particulares, praticado por agentes públicos armados – incluindo tortura, prisão ilegal e “justiciamento” -, afora repercussões nas esferas penal, civil e disciplinar, pode configurar improbidade administrativa, porque, além de atingir a pessoa-vítima, alcança, simultaneamente, interesses caros à Administração em geral, às instituições de segurança pública em especial, e ao próprio Estado Democrático de Direito. Precedente citado: REsp 1.081.743-MG, Segunda Turma, julgado em 24/3/2015. REsp 1.177.910-SE, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 26/8/2015, DJe 17/2/2016.