sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

RESPONSABILIDADE OBJETIVA. CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. NEXO CAUSAL E DANO MORAL RECONHECIDOS PELO TRIBUNAL DE ORIGEM.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.755.414 - RJ (2018/0154654-1)
 
RELATOR:MINISTRO HERMAN BENJAMIN
RECORRENTE:AMPLA ENERGIA E SERVIÇOS S.A
ADVOGADOS:JAYME SOARES DA ROCHA FILHO  - RJ081852
  LEONARDO FERREIRA LÖFFLER  - RJ148445
  VINÍCIUS MARTINS PEREIRA  - RJ134616
  ANA FLÁVIA DOS SANTOS RIGOTO FERREIRA  - RJ179845
RECORRIDO:SILVANIA MARIA PESSANHA BARRETO LEITE
RECORRIDO:ROBSON BARRETO LEITE
ADVOGADOS:ALEX DAFLON DOS SANTOS  - RJ095975
  ANDERSON BRUNO MOREIRA DE MORAES  - RJ157979
EMENTA
 
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. VIOLAÇÃO  DOS  ARTIGOS  489  E 1.022 DO CPC/2015. INOCORRÊNCIA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. NEXO CAUSAL E DANO MORAL RECONHECIDOS PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. REDUÇÃO DO QUANTUMINDENIZATÓRIO. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ.

1. Preliminarmente, constata-se que não se configura a ofensa aos arts. 489 e 1.022 do Código de Processo Civil/2015, uma vez que o Tribunal de origem julgou integralmente a lide e solucionou a controvérsia, tal como lhe foi apresentada.

2. Na hipótese dos autos, o Tribunal a quo consignou (fls. 308-310, e-STJ): "(...) A parte ré/1º Apelado alega fato de terceiro, mas ficou amplamente demonstrado ter se tratado de má prestação dos seus serviços, pois não observou os cuidados necessários de manutenção de sua rede elétrica, deixando fios caídos e pendentes que poderiam atingir qualquer pessoa, tendo no caso causado queimaduras em função da descarta elétrica no menor, ora parte autora/1ºs Apelantes. O desserviço praticado pela parte ré/1º Apelado prejudica a prática dos atos da vida civil e provocam aborrecimentos que superam os do cotidiano, configurando dano moral, gerando obrigação de indenizar, independentemente de prova atinente a prejuízo material, pois se trata de dano in re ipsa, com fulcro no artigo 186 e 927, do CC c/c artigo 5, X, da CFRB. (...) No tocante à pretendida redução do quantum indenizatório, este Egrégio Tribunal de Justiça consolidou entendimento de que a revisão do valor da indenização somente é possível quando exorbitante ou insignificante a importância arbitrada, em flagrante violação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, nos termo do Enunciado nº 116 do Aviso nº 55/2012 deste TJRJ e o verbete da súmula 343, do TJRJ. (...) Por fim, ressalta-se que este Tribunal de Justiça julgou caso análogo, onde a fornecedora de serviço, ora parte ré/1º Apelado, cometeu a mesma falha. O que demonstra que o total descaso com o consumidor, sendo certo que, além dos critérios de razoabilidade e proporcionalidade, deve o valor da indenização por dano moral ser majorado para R$ 100.000,00 (cem mil reais), para cada parte autora".

3. É inviável, portanto, analisar as teses defendidas no Recurso Especial – inexistência de ato ilícito, ausência de dano moral e nexo causal, e exorbitância do quantum indenizatório –,  pois inarredável a revisão do conjunto probatório dos autos para afastar as premissas fáticas estabelecidas pelo acórdão recorrido. Aplica-se, portanto, o óbice da Súmula 7/STJ.

4. Recurso Especial conhecido parcialmente e, nesse parte, não provido.
 
ACÓRDÃO
 
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça:  ""A Turma, por unanimidade, conheceu em parte do recurso e, nessa parte, negou-lhe provimento, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a)." Os Srs. Ministros Og Fernandes, Mauro Campbell Marques, Assusete Magalhães e Francisco Falcão (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator."
 
Brasília, 18 de setembro de 2018(data do julgamento).
 
 
MINISTRO HERMAN BENJAMIN
Relator

terça-feira, 4 de dezembro de 2018

Agências reguladoras têm o poder de fiscalizar, mas não o de legislar


Por Efraim Filho

“O Poder Legislativo é exercido pelo Congresso Nacional, que se compõe da Câmara dos Deputados e do Senado Federal”

Artigo 44 da Constituição Federal

A Constituição Federal de 1988 determinou que o Congresso Nacional, formado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, é o órgão que detém o monopólio para a instituição de leis de âmbito nacional. Desta forma, são os deputados e senadores que, ainda de acordo com a carta magna brasileira, devem “dispor sobre todas as matérias de competência da União”.

Esta é uma introdução importante ao analisarmos um caso que deve ter seu desfecho definido pelo Supremo Tribunal Federal no início de fevereiro: a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 4.874), apresentada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), que contesta uma resolução da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) de 2012 que proibiu a comercialização de cigarros com aroma e sabor.

A decisão que os ministros da corte deverão tomar nas próximas semanas é, em última instância, fundamental para que as agências reguladoras possam exercer seu papel na defesa dos interesses dos brasileiros, sem, entretanto, usurpar o papel de outros atores da sociedade.

Uma decisão do STF de 2014 comprova a tese de que o papel da Anvisa não pode se sobrepor ao do Congresso nacional. Ao julgar a ADI 4.954, que dispunha sobre a resolução 328/1999 da Anvisa que vedava a venda de artigos de conveniência em drogarias e farmácias. De acordo com o ministro relator Marco Aurélio Mello, “A circunstância de a Lei federal 9.782, de 1999, mediante a qual foi criada a aludida Agência, ter instituído amplo espaço de atuação regulatória em favor da autarquia não a torna titular de atribuição tipicamente legislativa". Todos os ministros seguiram o voto do relator.

Ou seja: a Anvisa não tem o poder de legislar.

No caso dos cigarros, é necessário ressaltar que a Anvisa possui papel preponderante na fiscalização da produção nacional e, por meio das secretarias de vigilância sanitária nos estados e municípios, garantir o cumprimento da legislação que rege o setor. Mas ela não pode ter o papel de decidir quais ingredientes podem ou não compor o produto.

Este é um tema da maior importância, pois em última instância trata do escopo e dos limites da atuação das agências reguladoras brasileiras. Pode parecer um exagero, mas, caso o STF decida por validar a resolução, o que impedirá que amanhã a Anvisa decida proibir a adição de açúcar nos refrigerantes vendidos no país? Ou que a Agência Nacional do Cinema (Ancine) decida que os filmes produzidos no Brasil não podem abordar certos temas?

A criação das agências reguladoras no início dos anos 90 marcou um momento decisivo para a modernização da economia do país. Mas é preciso que a decisão dos ministros do Supremo não tenha como efeito a substituição de poderes que, hoje, são regidos pela Constituição de 1988. Caso contrário, poderemos ver em um futuro muito próximo a proliferação de disputas semelhantes em diversos setores, o que com certeza irá contribuir para o aumento da já tão falada insegurança jurídica, um dos maiores desestímulos ao crescimento e ao desenvolvimento do país.